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Ter vida secreta é necessidade

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Ter vida secreta é uma necessidade

Ter vida secreta é necessidade, dizem psicólogos, mas o conflito entre desejo e sociedade pode causar sérios traumas!

Um recibo de cartão de crédito esquecido no lugar errado ou um e-mail em aberto na caixa postal do computador poderia ter acabado com tudo: com o casamento, com a carreira bem sucedida e com a reputação de decência que ele construiu numa vida inteira.

Acontece que, por mais de 10 anos, ele radicalmente manteve duas identidades paralelas: uma delas era do homem que vivia numa pacata vila do condado de Westchester e que trabalhava num escritório de Nova York, enquanto que o outro funcionava principalmente nos clubes noturnos, bares de aeroporto e bordéis. O primeiro recebia os clientes calorosamente e acenava aos vizinhos, às vezes apenas poucas horas depois de o outro ter voltado de um encontro de “trabalho” com prostitutas ou traficantes de cocaína.

A gota d’água para o fim dessa situação foi um simples aviso em pop-up pelo computador, num anúncio de um software de segurança eletrônica, advertindo que a vida online dele estava sendo “constantemente monitorada”. Foi o bastante para provocar pânico nesse empreendedor imobiliário de Nova York, que em seguida procurou um terapeuta.

A vida dupla desse homem é um exemplo extremo de como a aflição mental pode fragmentar uma identidade, afirma o psiquiatra que atendeu esse paciente, o Dr. Jay S. Kwawer, diretor de educação clínica no Instituto William Alanson White em Nova York. Kwawer discutiu esse caso numa palestra recente.

Os psicólogos dizem que a maioria dos adultos normais está bem preparada para começar uma vida secreta, quem sabe até para mantê-la. E a capacidade de manter um segredo é fundamental para um desenvolvimento social saudável, dizem os especialistas. O desejo de criar outras identidades – e o de se reinventar e o de fingir – podem perfeitamente se prolongar pela vida adulta.

E, nos últimos anos, pesquisadores concluíram que algumas habilidades psicológicas que servem para muitos evitarem colapsos mentais são as mesmas que podem colocar essas pessoas em risco crescente, quando prolongam essas atividades clandestinas.

“Num sentido bem profundo, você não tem um self, uma identidade, a não ser que tenha um segredo. Nós todos temos aqueles momentos em nossas vidas onde sentimos que estamos nos dissolvendo em nosso grupo social, ou no trabalho ou no casamento. Nesse caso é bom, dá prazer buscar uma atividade secreta, ou algum subterfúgio, para reafirmar nossa identidade, como alguém dissociado do grupo”, afirma o Dr. Daniel M. Wegner, professor de psicologia em Harvard. “E agora estamos descobrindo que algumas pessoas fazem isso de maneira mais eficiente que outras”.

As vidas secretas mais conhecidas são as mais espetaculares –o arquiteto Louis Kahn na verdade teve três vidas; Charles Lindbergh assumidamente teve duas. Mas esses são exemplos exagerados de um comportamento que é extremamente comum e variado, dizem os psicólogos.

Algumas pessoas jogam furtivamente, outras experimentam drogas. Tem gente que experimenta aulas de música, enquanto outras seguem um grupo religioso. E elas guardam seus segredos por diversas razões.

Há também milhares de pessoas – homens e mulheres gays que mantêm casamentos heterossexuais, por exemplo – cuja vergonha ou cuja negação a respeito de suas necessidades elementares os encaminham para excursões clandestinas por outros mundos.

Mas se a vida secreta será ou não destrutiva, concluem os especialistas, isso vai depender tanto da natureza do segredo quanto da estrutura psicológica do indivíduo.

Tudo que é secreto dá mais prazer

Há muito tempo os psicólogos vêm considerando a capacidade de guardar segredos como fundamental para um desenvolvimento saudável. Crianças a partir dos 6 ou 7 anos aprendem a fazer segredo sobre o presente que a mãe receberá no aniversário. Na adolescência e na idade adulta, uma certa fluência com as pequenas mentiras sociais é associada à boa saúde mental.

Os pesquisadores já confirmaram que o segredo pode despertar a atração, ou como colocou Oscar Wilde, “O ato mais banal se torna delicioso se é secreto”.

Um estudo feito com homens e mulheres que vivem no Texas relatou que os relacionamentos passados que continuam vindo à lembrança dessas pessoas freqüentemente são esses relacionamentos secretos.

Num outro estudo, psicólogos em Harvard descobriram que podiam aumentar a atração entre desconhecidos, homens e mulheres, ao estimulá-los a flertar furtivamente, como por debaixo de uma mesa, como parte de um experimento científico.

O impulso de agir como persona inteiramente diferente também é amplamente comum em culturas diferentes, dizem os cientistas sociais, e pode ser motivado tanto pela curiosidade quanto por simples travessura ou então por uma sincera busca espiritual.

Certamente é um conflito familiar para quase todos que já escapuliram temporariamente de seu cotidiano, seja nas férias, a negócios ou quando vai viver num outro país.

“Acontecia frequentemente quando alguém saía de férias no verão e se transformava numa outra pessoa, como quem saía para acampar ou ia para a Europa e se transfigurava, em espírito ou por meio de uma experiência saudável”, diz a dra. Sherry Turkle, socióloga do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

Agora, segundo a especialista, as pessoas frequentemente se transformam em outras pela Internet, sem nem precisar sair da poltrona: um contínuo que fica logo ali, perto de você, pode assinar como fulanodetal@xyz.com.br e navegar por salas de bate-papo como OcaradeArmani, Brisa Suave ou Homem-Trovão.

Recentemente, a dra. Turkle estudou a utilização de jogos interativos online, como o The Sims Online, onde as pessoas estabelecem famílias e comunidades. Após realizar entrevistas detalhadas com 200 jogadores regulares ou eventuais, ela diz que muitas pessoas utilizam os jogos como uma maneira de formar famílias que gostariam de ter tido, ou pelo menos como forma de viver versões alternativas de suas próprias vidas.

Uma jovem de 16 anos que vive com um pai abusivo fez uma simulação de seu relacionamento com ele no jogo The Sims Online. No jogo ela se transfigurava, aleatoriamente, em um rapaz de 16 anos, numa jovem mais velha e mais poderosa e numa outra personalidade, mais assertiva, entre outras identidades. Foi como uma filha mais resoluta, diz a Dra. Turkle, que a jovem percebeu que era possível perdoar o pai dela, caso não conseguisse transformá-lo.

“Acho que o que as pessoas estão fazendo agora pela Internet”, diz a cientista, “tem um significado psicológico profundo, pela forma como elas usam outras identidades para expressar problemas e potencialmente resolvê-los, numa região que é relativamente livre de consequências”.

Bloqueando lembranças desagradáveis

Já no mundo aqui fora, lugar tão cheio de perigos e consequências, estudos indicam que a maioria das pessoas considera ser mentalmente exaustivo manter segredos bombásticos por muito tempo. Vidas secretas então, nem se fala…

O simples ato de tentar suprimir a informação cria uma espécie de efeito-rebote, fazendo com que pensamentos sobre um caso extraconjugal, excursões de fim de noite ou uma dívida secreta inundem a consciência, especialmente quando uma pessoa que poderia ser atingida por uma revelação está por perto.

É como acontece com um aparelho de televisão ligado num bar superlotado – o tal lance secreto permanece ligado na mente, atraindo a atenção apesar de esforços conscientes para mudar o foco. Os pensamentos suprimidos retornam até mesmo nos sonhos, de acordo com um estudo publicado recentemente.

A força desse efeito, não há dúvidas, varia de pessoa para pessoa, de acordo com os psiquiatras. Em casos raros, quando as pessoas estão patologicamente sem remorsos, elas não ligam nem percebem o impacto em potencial de seu segredo sobre outras pessoas, e portanto nem sentem a tensão da manutenção do segredo.

Já os que são pagos para viver vidas secretas, como os agentes da inteligência (espiões), pelo menos sabem qual deve ser seu papel, e têm orientações claras que lhes indicam o quanto podem revelar, e para que pessoas exatamente.

Mas, numa série de experiências realizadas na década passada, os psicólogos identificaram um grupo maior de pessoas, batizado de grupo dos repressores (de informação). São de 10% a 15% da população, adeptos da técnica de ignorar ou suprimir a informação que lhes é embaraçosa – pessoas bem capacitadas para manter segredos.

Os repressores de informação apresentam índices baixos nos questionários que medem ansiedade e atitudes defensivas – indicando, por exemplo, que essas pessoas raramente são ressentidas, se preocupam com dinheiro, ou se afligem com pesadelos e dores de cabeça. São pessoas que se avaliam positivamente e que não se atormentam por pouco.

Embora pouco seja conhecido sobre o estágio mental de pessoas assim, alguns psicólogos acreditam que elas aprenderam a bloquear pensamentos aflitivos, distraindo-se com boas recordações. Com o passar do tempo – na verdade, com a prática – isso pode se transformar num hábito, bloqueando o acesso deles a memórias e segredos potencialmente humilhantes.

“Esse talento provavelmente lhes será bem útil na luta diária para evitar pensamentos indesejados de todos os tipos, o que inclui os pensamentos indesejados que surgem das tentativas de suprimir seus segredos na presença de outras pessoas”, diz o Dr. Wegner, de Harvard.

É mais fácil silenciar esses pensamentos. E quanto mais tempo dura essa atividade encoberta, mais difícil poderá ser confessá-la em seguida.

Gays dentro do armário

Em alguns casos, forças bem mais poderosas estão em jogo nesse molde das vidas secretas.

Muitos homens gays e algumas lésbicas casam com parceiros heterossexuais antes de definirem sua identidade sexual, ou até mesmo em desafio a essa identidade.

O objetivo é agradar aos pais, cobrir sua própria vergonha ou querer se tornar mais auto-aceitável ou aceitável para a sociedade, diz o Dr. Richard A. Isay, psiquiatra na Universidade de Cornell que já foi terapeuta de muitos homens gays que estão “no armário”.

“Muito frequentemente”, diz o psiquiatra, “esses homens lutam para não atender aos seus próprios desejos, e começam suas vidas secretas em condição desesperada. No final das contas, esse comportamento força decisões dolorosas sobre como viver, ou como se isolar, junto às famílias que eles adoram”.

“Sei que não busquei ser do jeito que eu sou, ter a orientação sexual que eu tenho, e também sei que sempre fui do jeito que eu sou agora”, foi o que um homem escreveu numa carta publicada no livro de Isay, “Tornar-se Gay”: “Sei que está ficando mais difícil viver nessa concha solitária onde estou, mas não encontro saída fora dela”.

Revelando a vida secreta

Quando a revelação de uma vida secreta vier a destruir ou a envenenar para sempre a vida particular de alguém, as pessoas devem ou assumir e escolher, ou então enfrentarem o risco de uma perturbação mental, conforme dizem muitos terapeutas.

O Dr. Seth M. Aronson, professor-assistente de psiquiatria na Escola de Medicina de Monte Sinai, já tratou um pediatra que vivia nessa condição. O paciente tinha uma esposa e uma criança pequena em casa, e escapulia pela noite nos bares, visitando prostitutas e até mesmo brigando com os rufiões das mulheres.

Numa das sessões, o homem estava tão bêbado que desmaiou; numa outra, veio acompanhado de uma prostituta. “Era uma daquelas clássicas divisões de personalidade, onde a esposa era perfeita e maravilhosa, e ele buscava se menosprezar com essas outras mulheres”, sendo que as duas vidas não poderiam coexistir por muito tempo, diz Aronson.

Num famoso texto sobre o assunto das vidas duplas, publicado em 1960, o psicanalista inglês Dr. Donald W. Winnicott argumentava que um falso self emergia em determinadas situações em que as crianças são criadas para serem tão intimamente sintonizadas com expectativas alheias que se tornam surdas aos próprios anseios e necessidades.

“Na verdade, é como se elas imolassem, queimassem vivas, partes delas”, diz o Dr. Kwawer do White Institute.

O pediatra tratado por Aronson, por exemplo, foi criado num ambiente fundamentalista cristão em que a mãe dele várias vezes o menosprezava, utilizando comparações com um tio vagabundo e beberrão. O paciente de Kwawer, o tal empreendedor imobiliário, tinha pais que franziam sobrancelhas a qualquer sinal de excessos, e impingiram no filho um forte sentido da necessidade de preservar a imagem da família. Ele se casou cedo, em parte para agradar aos pais.

Os dois homens ainda se submetem ao tratamento psicoterapêutico, mas agora conseguiram integrar suas vidas, segundo seus terapeutas. O pediatra cortou suas atividades extracurriculares, mentalmente voltou para casa e confessou alguns de seus problemas à esposa.

O construtor de imóveis se separou da mulher, mas vive por perto e ajuda na criação dos filhos. A separação causou um período de depressão para todos os envolvidos, diz Dr. Kwawer, mas o homem agora conseguiu recuperar a energia no trabalho e se reconectou com os amigos e com os filhos. Os encontros secretos acabaram, assim como o uso de drogas, e ele se sente novamente no controle da própria vida.

“Ao contrário do que muitas pessoas poderiam pensar”, afirma Kwawer, “frequentemente uma vida secreta pode fazer sair da escuridão aspectos mais vívidos, íntimos e energizados das pessoas”.

“Que atire a primeira pedra quem não tiver seu lado B!” (Joemir Rosa).

By Benedict Carey.

 

Faz de conta…

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 09/01/2012 by Joe

Recentemente uma professora, que veio da Polônia para o Brasil ainda muito jovem, proferia uma palestra e, com muita lucidez, trazia pontos importantes para reflexão dos ouvintes.

– “Já vivi o bastante para presenciar três períodos distintos no comportamento das pessoas”, dizia ela.

“O primeiro momento eu vivi na infância, quando aprendi com meus pais que era preciso ser. Ser honesta, ser educada, ser digna, ser respeitosa, ser amiga, ser leal”.

“Algumas décadas mais tarde fui testemunha da fase do ter. Era preciso ter. Ter boa aparência, ter dinheiro, ter status, ter coisas, ter, ter e ter…”

“Atualmente estou presenciando a fase do faz de conta!”

Analisando sob esse ponto de vista chegaremos à conclusão que a professora tem razão. Hoje, as pessoas fazem de conta que está tudo bem.

Pais fazem de conta que educam, professores fazem de conta que ensinam, alunos fazem de conta que aprendem…

Profissionais fazem de conta que são competentes, governantes fazem de conta que se preocupam com o povo e o povo faz de conta que acredita…

Pessoas fazem de conta que são honestas, líderes religiosos se passam por representantes de Deus, e fiéis fazem de conta que têm fé…

Doentes fazem de conta que têm saúde, políticos fazem de conta que são dignos e a justiça faz de conta que é imparcial…

Traficantes se passam por cidadãos de bem e consumidores de drogas fazem de conta que não contribuem com esse mercado do crime…

Pais fazem de conta que não sabem que seus filhos usam drogas, que se prostituem, que estão se matando aos poucos, e os filhos fazem de conta que não sabem que os pais sabem…

Corruptos se fazem passar por idealistas e terroristas fazem de conta que são justiceiros…

E a maioria da população faz de conta que está tudo bem…

Mas uma coisa é certa: não podemos fazer de conta quando nos olhamos no espelho da própria consciência! Podemos até arranjar desculpas para explicar nosso faz de conta, mas não justificamos!

Importante salientar, todavia, que essa representação no dia-a-dia, esse faz de conta causa prejuízos para aqueles que lançam mão desse tipo de comportamento. A pessoa que age assim termina confundindo a si mesma e caindo num vazio, pois nem ela mesma sabe quem é, de fato, e acaba se traindo em algum momento. E isso é extremamente cansativo e desgastante.

A pessoa que vive de aparências, ou finge ser quem não é, corre sérios riscos de entrar em depressão. Isto é perfeitamente compreensível, graças à batalha que trava consigo mesma e o desgaste para manter uma realidade falsa.

Se é fácil enganar os outros, é impossível enganar a própria consciência.

Raras são as pessoas realmente autênticas. Por isso elas se destacam nos ambientes em que se movimentam. São aquelas que não representam, apenas são o que são, sem fazer de conta. São profissionais éticos e competentes, amigos leais, pais zelosos na educação dos filhos, políticos honestos, religiosos fiéis aos ensinos que ministram.

São, enfim, pessoas especiais, descomplicadas, de atitudes simples, mas coerentes e, acima de tudo, fiéis consigo mesmas.

Por todas essas razões vale a pena ser quem se é, ainda que isso não agrade os outros.

Afinal, não é aos outros que prestaremos contas das nossas ações, mas sim, à nossa própria consciência!

Desconheço o autor.

Por quem os sinos dobram

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 02/07/2010 by Joe

Um texto que, apesar de relatar um fato antigo, nunca foi tão atual!

Então estamos nos aproximando cada vez mais do Mal Absoluto. Quando rapazes, em pleno controle de suas faculdades mentais, são capazes de arrastar um menino pelas ruas de uma cidade, isso não é apenas um ato isolado: todos nós, em maior ou menor escala, somos culpados.

Somos culpados pelo silêncio que permitiu que a situação em nossa cidade chegasse a este ponto.

Somos culpados porque vivemos em uma época de “tolerância”, e perdemos a capacidade de dizer NÃO.

Somos culpados porque nos horrorizamos hoje, mas nos esquecemos amanhã, quando há outras coisas mais importantes para fazer e para pensar.

Somos os olhos que viram o carro passar, o medo que nos impediu de telefonar para a polícia. Somos a polícia, que recebeu alguns telefonemas através do número 190 e demorou para reagir, porque o Mal Absoluto parece já não pedir urgência para nada. Somos o asfalto por onde se espalharam os pedaços de corpo e os restos de sonhos do menino preso ao cinto de segurança.

A cada dia uma nova barbárie, em maior ou menor escala. A cada dia algum protesto, mas o resto é silêncio. Estamos acostumados, não é verdade?

Muitos séculos atrás, John Donne escreveu: “nenhum homem é uma ilha, que se basta a si mesma. Somos parte de um continente; se um simples pedaço de terra é levado pelo mar, a Europa inteira fica menor. A morte de cada ser humano me diminui, porque sou parte da humanidade. Portanto, não me perguntem por quem os sinos dobram: eles dobram por ti.”

Na verdade, podemos pensar que os sinos estão tocando porque o menino morreu, mas eles dobram mesmo é por nós. Tentam nos acordar deste cansaço e torpor, desta capacidade de aceitar conviver com o Mal Absoluto, sem reclamar muito – desde que ele não nos toque.

Mas não somos uma ilha, e a cada momento perdemos um pouco mais de nossa capacidade de reagir. Ficamos chocados, assistimos às entrevistas, olhamos para nossos filhos, pedimos a Deus que nada aconteça conosco. Saímos para o trabalho ou para a escola olhando para os lados, com medo de crianças, jovens, adultos. Entra ano, sai ano, mudam-se governos, e tudo apenas piora. O que dizer? Que palavra de esperança posso colocar aqui neste post?

Nenhuma.

Talvez apenas pedir que os sinos continuem tocando por nós. Dia e noite, noite e dia, até que já não consigamos mais fingir que não estamos escutando, que não é conosco, que estas coisas se passam apenas com os outros. Que estes sinos continuem dobrando, sem nos deixar dormir, nos obrigando a ir até a rua, parar o trânsito, fechar as lojas, desligar as televisões, e dizer: “basta! Não aguento mais estes sinos. Preciso fazer alguma coisa porque quero de volta a minha paz”. Neste momento, entenderemos que embora culpemos a polícia, os assaltantes, o silêncio, os políticos, o hábito, apenas nós podemos parar estes sinos.

Nosso poder é muito maior do que pensamos – trata-se de entender que não somos uma ilha, e precisamos usá-lo. Enquanto isso não acontecer, o Mal Absoluto continuará ampliando seu reinado, e um belo dia corremos o risco de acreditar que ele é a nossa única alternativa, não existe outra maneira de viver, melhor ficar escutando os sinos e não correr riscos.

Não podemos deixar que chegue este dia. Não tenho fórmulas para resolver a situação, mas sou consciente de que não sou uma ilha, e que a morte de cada ser humano me diminui. Preciso parar minha cidade. Não apenas por uma hora, um dia, mas pelo tempo que for necessário. E recomeçar tudo de novo. E, se não der certo, tentar não apenas mais uma vez, mas setenta vezes. Chega de culpar a polícia, os assaltantes, as diferenças sociais, as condições econômicas, as milícias, os traficantes, os políticos.

Eu sou a minha cidade, e só eu posso mudá-la. Mesmo com o coração sem esperança, mesmo sem saber exatamente como dar o primeiro passo, mesmo achando que um esforço individual não serve para nada, preciso colocar mãos à obra. O caminho irá se mostrar por si mesmo, se eu vencer meus medos e aceitar um fato muito simples: cada um de nós faz uma grande diferença no mundo.

By Paulo Coelho, lembrando que este ano temos eleições e que a força está nas mãos de todos nós. Não aceite a mesmice que vem tomando conta do país há anos.

Faz de conta

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 14/04/2010 by Joe

Recentemente uma professora que veio da Polônia para o Brasil ainda muito jovem, proferia uma palestra e, com muita lucidez, trazia pontos importantes para reflexão dos ouvintes.

– “Já vivi o bastante para presenciar três períodos distintos no comportamento das pessoas”, dizia ela.

“O primeiro momento eu vivi na infância, quando aprendi com meus pais que era preciso ser. Ser honesta, ser educada, ser digna, ser respeitosa, ser amiga, ser leal”.

“Algumas décadas mais tarde fui testemunha da fase do ter. Era preciso ter. Ter boa aparência, ter dinheiro, ter status, ter coisas, ter, ter e ter…”

“Na atualidade estou presenciando a fase do faz de conta”.

Analisando sob esse ponto de vista chegaremos à conclusão que a professora tem razão. Hoje, as pessoas fazem de conta que está tudo bem.

Pais fazem de conta que educam, professores fazem de conta que ensinam, alunos fazem de conta que aprendem…

Profissionais fazem de conta que são competentes, governantes fazem de conta que se preocupam com o povo e o povo faz de conta que acredita…

Pessoas fazem de conta que são honestas, líderes religiosos se passam por representantes de Deus, e fiéis fazem de conta que têm fé…

Doentes fazem de conta que têm saúde, criminosos fazem de conta que são dignos e a justiça faz de conta que é imparcial…

Traficantes se passam por cidadãos de bem e consumidores de drogas fazem de conta que não contribuem com esse mercado do crime…

Pais fazem de conta que não sabem que seus filhos usam drogas, que se prostituem, que estão se matando aos poucos, e os filhos fazem de conta que não sabem que os pais sabem…

Corruptos se fazem passar por idealistas e terroristas fazem de conta que são justiceiros…

E a maioria da população faz de conta que está tudo bem…

Mas uma coisa é certa: não podemos fazer de conta quando nos olhamos no espelho da própria consciência! Podemos até arranjar desculpas para explicar nosso faz de conta, mas não justificamos.

Importante salientar, todavia, que essa representação no dia-a-dia, esse faz de conta, causa prejuízos para aqueles que lançam mão desse tipo de comportamento.

A pessoa que age assim termina confundindo a si mesma e caindo num vazio, pois nem ela mesma sabe quem é, de fato, e acaba se traindo em algum momento. E isso é extremamente cansativo e desgastante.

A pessoa que vive de aparências ou finge ser quem não é corre sérios riscos de entrar em depressão. Isto é perfeitamente compreensível, graças à batalha que trava consigo mesma e o desgaste para manter uma realidade falsa.

Se é fácil enganar os outros, é impossível enganar a própria consciência.

Raras são as pessoas realmente autênticas. Por isso elas se destacam nos ambientes em que se movimentam. São aquelas que não representam, apenas são o que são, sem fazer de conta. São profissionais éticos e competentes, amigos leais, pais zelosos na educação dos filhos, políticos honestos, religiosos fiéis aos ensinos que ministram.

São, enfim, pessoas especiais, descomplicadas, de atitudes simples, mas coerentes e, acima de tudo, fiéis consigo mesmas.

Por todas essas razões vale a pena ser quem se é, ainda que isso não agrade os outros.

Afinal, não é aos outros que prestaremos contas das nossas ações, mas sim, à nossa própria consciência.

Autoria desconhecida.

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