Arquivo para Parto

A gravidez de um pai

Posted in Homenagem with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 10/08/2014 by Joe

Pai e bebê

A gravidez de um pai não se dá nas entranhas, mas fora delas.

Ela se dá primeiro no coração, onde o sentimento de paternidade é gerado. Um desejo de ser e de se ver prolongado em outra vida, que seja parte de si mesmo, mas com vida própria. Imagino que deve ser frustrante a princípio. Durante toda a espera, um pai é um pai sem experimentar o gosto de ser, sem os inconvenientes de uma gravidez, mas também sem as lindas emoções que tanto mexem com a gente.

E quando ele sente pela primeira vez a vida que ajudou a gerar, tudo toma outra forma. Ele sente um chute e já diz que este será um grande jogador de futebol. E, muitas vezes, se surpreende e se maravilha quando vê uma princesinha que sabe chutar tão bem. Mas tanto faz. Está ali um sonho que se torna palpável.

E um parto de um pai se dá quando ele pega, pela primeira vez, sua criança nos braços, quando ele se vê em características naquele serzinho tão miudinho que nem se dá conta ainda que veio ao mundo e que se tornou o mundo de alguém. E os sentimentos e emoções se atropelam dentro dele. E ele sente que, a partir desse instante, a vida nunca mais será a mesma. E ele precisa olhar dez, cem, mil vezes para acreditar que tudo não passa de um sonho. E, geralmente, há um enorme sentimento de orgulho que toma posse dele.

Assim se forma um pai. Pronto para ensinar tudo o que aprendeu da vida, um dia ele descobre que não sabe realmente muito, que na verdade aprende a cada instante. Diante da sua criança ele se torna um adulto vulnerável e acessível. E vai gerando, pouquinho a pouquinho, dentro de si mesmo, a arte de se tornar um pai.

By Letícia Thompson.

Analogia

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , on 05/05/2014 by Joe

Gêmeos no ventre

No ventre de uma mulher grávida estavam dois bebês. O primeiro pergunta ao outro:

– “Você acredita na vida após o nascimento?”

– “Certamente. Algo tem de haver após o nascimento. Talvez estejamos aqui principalmente porque nós precisamos nos preparar para o que seremos mais tarde.”

– “Bobagem… não há vida após o nascimento. Como verdadeiramente seria essa vida?”

– “Eu não sei exatamente, mas certamente haverá mais luz do que aqui. Talvez caminhemos com nossos próprios pés e comeremos com a boca.”

– “Isso é um absurdo! Caminhar é impossível. E comer com a boca? É totalmente ridículo! O cordão umbilical nos alimenta. Eu digo somente uma coisa: a vida após o nascimento está excluída – o cordão umbilical é muito curto.”

– “Na verdade, certamente há algo. Talvez seja apenas um pouco diferente do que estamos habituados a ter aqui.”

– “Mas ninguém nunca voltou de lá depois do nascimento. O parto apenas encerra a vida. E, afinal de contas, a vida é nada mais do que a angústia prolongada na escuridão.”

– “Bem, eu não sei exatamente como será depois do nascimento, mas com certeza veremos a mamãe e ela cuidará de nós.”

– “Mamãe? Você acredita na mamãe? E onde ela supostamente está?”

– “Onde? Em tudo à nossa volta! Nela e através dela nós vivemos. Sem ela tudo isso não existiria.”

– “Eu não acredito! Eu nunca vi nenhuma mamãe, por isso é claro que não existe nenhuma.”

– “Bem, mas às vezes, quando estamos em silêncio, você pode ouví-la cantando, ou sente como ela afaga nosso mundo. Sabe… eu penso que só então a vida real nos espera e agora apenas estamos nos preparando para ela!”

Desconheço a autoria.

Coragem de não se acostumar

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 06/05/2013 by Joe

Coragem para não se acostumar

A alegria pode deprimir. Não é exagero. A alegria deprime mais do que o sofrimento. A pessoa adquiriu a casa, formou a família, os filhos crescem com saúde, tem um carro na garagem, um trabalho proveitoso, está casada com quem gostaria e, no final da noite, um vazio volta a atormentar.

A noite vem tão rápido que ela pensa que é um chapéu. Nada está errado e isso incomoda terrivelmente. O que reclamar? Quem culpar?

Chegou até o topo e falta expectativa e vontade para descer. A dor torna-se somente uma preguiça de se levantar. É semelhante à depressão pós-parto. Uma ânsia de destruir as conquistas para reiniciar. O receio de não suportar o pique do entusiasmo, de não valorizar o que foi feito, de não ser merecedora do espaço. Uma desvalia que aparece no mais profundo orgulho.

Depois de uma alegria intensa, de cumprir os desejos, uma coceira nos olhos enterra os olhos: e agora, o que vou fazer? Não há nenhum motivo óbvio para se lutar com garra. Não há dívidas e problemas para se preocupar. Não há um obstáculo, uma doença, uma teimosia, uma conspiração, um ódio. Não há motivo para falar mal de si e dos outros. Nada que seja levado a sério e que imponha uma força extra. A alegria passa a ser previsível, equilíbrio, rotina. Os horários estão ajustados: a musculação de manhã, o inglês de noite, o cinema semanalmente, os jantares e alguma coisa diz que ainda não está bom porque está bom demais.

O tédio prospera com quem conseguiu tudo e com quem nada conseguiu. A precariedade e o fastio são parentes. O tédio é democrático. Enfrenta-se o terror de que, depois de uma alegria forte, teremos alegrias menores, risos de meia boca.

O dia seguinte de um grande amor é uma tristeza só. Um abandono. Depois das alturas, rastejar entre a cama e a cozinha. Raros confessam, porém a cabeça fica nas nuvens, desligada, não sobrando chance de repetir um enlace igual. É insuportável cogitar que acabamos de viver o máximo da existência e ainda assim continuar vivendo para cumprir tabela. Não, ninguém gosta de jogar amistoso, sem o risco de perder feio ou ganhar apertado…

Felicidade é não se acostumar com ela. Entende-se o motivo de muitos que jogam fora a felicidade em uma briga ridícula e depois se arrependem. Jogam fora porque são vítimas da alegria, não da tristeza. Querem cobrar o que veio de graça.

By Fabrício Carpinejar.

%d blogueiros gostam disto: