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Gaiolas e asas

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Gaiolas e asas

Os pensamentos me chegam de forma inesperada, sob a forma de aforismos. Fico feliz porque sei que Lichtenberg, William Blake e Nietzsche frequentemente eram também atacados por eles. Digo “atacados“ porque eles surgem repentinamente, sem preparo, com a força de um raio. Aforismos são visões: fazem ver, sem explicar.

Pois ontem, de repente, esse aforismo me atacou: “Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas“…

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

Esse simples aforismo nasceu de um sofrimento: sofri conversando com professoras de segundo grau, em escolas de periferia. O que elas contam são relatos de horror e medo. Balbúrdia, gritaria, desrespeito, ofensas, ameaças … E elas, timidamente, pedindo silêncio, tentando fazer as coisas que a burocracia determina que sejam feitas, dar o programa, fazer avaliações …

Ouvindo os seus relatos vi uma jaula cheia de tigres famintos, dentes arreganhados, garras à mostra – e as domadoras com seus chicotes, fazendo ameaças fracas demais para a força dos tigres… Sentir alegria ao sair de casa para ir para a escola? Ter prazer em ensinar? Amar os alunos? O seu sonho é livrar-se de tudo aquilo. Mas não podem. A porta de ferro que fecha os tigres é a mesma porta que as fecha junto com os tigres.

Nos tempos da minha infância eu tinha um prazer cruel: pegar passarinhos. Fazia minhas próprias arapucas, punha fubá dentro e ficava escondido, esperando… O pobre passarinho vinha, atraído pelo fubá. Ia comendo, entrava na arapuca, pisava no poleiro – e era uma vez um passarinho voante. Cuidadosamente, eu enfiava a mão na arapuca, pegava o passarinho e o colocava dentro de uma gaiola. O pássaro se lançava furiosamente contra os arames, batia as asas, crispava as garras, enfiava o bico entre nos vãos, na inútil tentativa de ganhar de novo o espaço, ficava ensanguentado… sempre me lembro com tristeza da minha crueldade infantil.

Violento, o pássaro que luta contra os arames da gaiola? Ou violenta será a imóvel gaiola que o prende? Violentos, os adolescentes de periferia? Ou serão as escolas que são violentas? As escolas serão gaiolas?

Me falaram sobre a necessidade das escolas dizendo que os adolescentes de periferia precisam ser educados para melhorarem de vida. De acordo. É preciso que os adolescentes tenham uma boa educação. Uma boa educação abre os caminhos de uma vida melhor. Mas, eu pergunto: nossas escolas estão dando uma boa educação? E o que é uma boa educação?

O que os burocratas pressupõe sem pensar é que os alunos ganham uma boa educação se aprendem os conteúdos dos programas oficiais. E para se testar a qualidade da educação eles criam mecanismos, provas, avaliações, acrescidos dos novos exames elaborados pelo Ministério da Educação.

Mas será mesmo? Será que a aprendizagem dos programas oficiais se identifica com o ideal de uma boa educação? Você sabe o que é “dígrafo“? E os usos da partícula “se“? E o nome das enzimas que entram na digestão? E o sujeito da frase “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heróico o brado retumbante“? Qual a utilidade da palavra “mesóclise“?

Pobres professoras, também engaioladas… São obrigadas a ensinar o que os programas mandam, sabendo que é inútil. Isso é hábito velho das escolas. Bruno Bettelheim relata sua experiência com as escolas:

“Fui forçado (!) a estudar o que os professores haviam decidido que eu deveria aprender – e aprender à sua maneira…“

O sujeito da educação é o corpo porque é nele que está a vida. É o corpo que quer aprender para poder viver. É ele que dá as ordens. A inteligência é um instrumento do corpo cuja função é ajudá-lo a viver. Nietzsche dizia que ela, a inteligência, era “ferramenta“ e “brinquedo“ do corpo. Nisso se resume o programa educacional do corpo: aprender “ferramentas“, aprender “brinquedos“.

“Ferramentas“ são conhecimentos que nos permitem resolver os problemas vitais do dia a dia. “Brinquedos“ são todas aquelas coisas que, não tendo nenhuma utilidade como ferramentas, dão prazer e alegria à alma. No momento em que escrevo este texto estou ouvindo o coral da 9ª sinfonia. Não é ferramenta. Não serve para nada. Mas enche a minha alma de felicidade.

Nessas duas palavras, ferramentas e brinquedos, está o resumo educação.

Ferramentas e brinquedos não são gaiolas. São asas. Ferramentas me permitem voar pelos caminhos do mundo. Brinquedos me permitem voar pelos caminhos da alma. Quem está aprendendo ferramentas e brinquedos está aprendendo liberdade, não fica violento. Fica alegre, vendo as asas crescerem…

Assim todo professor, ao ensinar, teria que perguntar:

“Isso que vou ensinar, é ferramenta? É brinquedo? Se não for é melhor deixar de lado”.

As estatísticas oficiais anunciam o aumento das escolas e o aumento dos alunos matriculados. Esses dados não me dizem nada. Não me dizem se são gaiolas ou asas. Mas eu sei que há professores que amam o voo dos seus alunos. Há esperança…

By Rubem Alves.

Acertos e erros

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 23/11/2012 by Joe

Você gosta de errar? Bom, se você responder que não, é normal, natural.

Nós somos “instruídos”, “educados”, “treinados” para não errarmos! Mas não deveria ser assim…

O erro deveria ser considerado como uma ferramenta de aprendizagem da vida! Nós deveríamos receber uma delegação para errarmos! Porém, com uma condição: não repetirmos o mesmo erro.

Mas os erros deveriam, sim, ser cometidos pela ação e jamais por omissão!

Mesmo assim, tem pessoas que cometem diversos erros, repetidas vezes, como se gostassem de errar. Algumas vezes de forma inconsciente, mas deixando a ideia de que são desligadas ou incompetentes.

Você quer ter uma ideia das causas mais comuns destes erros, aos quais me refiro?

O medo de arriscar-se! Viver o constante dilema entre fazer o que gosta e o que é certo! Ser inflexível e resistir às mudanças!

Agora analise alguns dos erros que são cometidos repetidamente, sem levar a um aprendizado: resolver problemas buscando eliminar seus efeitos e não procurando acabar com as respectivas causas.

Guardar para si todo conhecimento, informação e novidade. Pensando que isso significa ter ou acumular poder.

Colocar a culpa nos outros pode ser uma postura mais fácil, ao invés de consertar as atitudes. Achar que a construção de felicidade está na construção de um mundo unicamente material. Esquecendo que felicidade é algo que construímos diariamente dentro de nós mesmos!

Para finalizar, gostaria que você compreendesse que a repetição de um erro não é condição suficiente para transformá-lo em acerto. Precisamos ficar antenados, não deixar que a culpa nos consuma. Só assim construiremos nossa liberdade de errar, aprender com os erros e acertar!

Pense nisso!

Desconheço a autoria.

A opinião dos outros

Posted in Reflexão with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 24/04/2012 by Joe

Você se importa com a opinião que os outros têm a seu respeito?

Se a sua resposta for não, então você é uma pessoa que sabe de si mesma. Que se conhece. É auto-suficiente.

No entanto, se a opinião dos outros sobre você é decisiva, vamos pensar um pouco sobre o quanto isso pode lhe ser prejudicial.

O primeiro sintoma de alguém que está sob o jugo da opinião alheia é a dependência de elogios. Se ninguém disser que o seu cabelo, a sua roupa ou outro detalhe qualquer está bem, a pessoa não se sente segura.

Se alguém lhe diz que está com aparência de doente, a pessoa se sente adoentada e logo procura um médico.

Se ouve alguém dizer que está gorda, desesperadamente tenta diminuir o peso.

Mas se disserem que é bonita, inteligente, esperta, ela também acredita.

Se lhe dizem que é feia, a pessoa se desespera. Principalmente se não tem condições de reparar a suposta feiúra com cirurgia plástica.

Existem pessoas que ficam o tempo todo à procura de alguém que lhes diga algo que as faça se sentir seguras, mesmo que esse alguém não as conheça bem.

Há pessoas que dependem da opinião alheia e se infelicitam na tentativa de agradar sempre. São mulheres que aumentam ou diminuem seios, lábios, bochechas, nariz, para agradar seu pretendido. Como se isso fosse garantir o seu amor…

São homens que fazem implante de cabelo, modificam dentes, queixo, nariz, malham até à exaustão, para impressionar a sua eleita.

E, quando essas pessoas, inseguras e dependentes, não encontram ninguém que as elogie, que lhes diga o que desejam ouvir, se infelicitam e, não raro, caem em depressão.

Não se dão conta de que a opinião dos outros é superficial e leviana, pois geralmente não conhecem as pessoas das quais falam.

Para que você seja realmente feliz, aprenda a se conhecer e a se aceitar como você é. Não acredite em tudo o que falam a seu respeito. Não se deixe impressionar com falsos elogios, nem com críticas infundadas.

Seja você.

Descubra o que tem de bom em sua intimidade e valorize-se. Ninguém melhor do que você para saber o que se passa na sua alma.

Procure estar bem com a sua consciência, sem neurose de querer agradar os outros, pois os outros nem sempre dão valor aos seus esforços.

A meditação é excelente ferramenta de auto-ajuda. Mergulhar nas profundezas da própria alma em busca de si mesmo é arte que merece atenção e dedicação.

Quando a pessoa se conhece, podem emitir dela as opiniões mais contraditórias que ela não se deixa impressionar, nem se iludir, pois sabe da sua realidade.

Nesses dias em que as mídias tentam criar protótipos de beleza física, e enaltecer a juventude do corpo como único bem que merece investimento, não se deixe iludir.

Você vale pelo que é e não pelo que tem ou aparenta ser. A verdadeira beleza é a da alma. A eterna juventude é atributo do espírito imortal.

O importante mesmo, é que você se goste. Que você se respeite. Que se cuide e se sinta bem.

A opinião de alguém só deve fazer sentido e ter peso se esse alguém estiver realmente interessado na sua felicidade e no seu bem-estar.

Nenhuma opinião que emitam sobre você deve provocar tristeza ou alegria em demasia. Os elogios levianos não acrescentam nada além do que você é, e as críticas negativas não tornarão você pior.

Busque o auto-conhecimento e aprenda a desenvolver a auto-estima.

Mas lembre-se: seja exigente para consigo mesmo e indulgente para com os outros.

Eis uma fórmula segura para que você encontre a auto-confiança e a segurança necessárias ao seu bem-estar efetivo.

E jamais esqueça que a verdadeira elegância é a do caráter, que procede da alma justa e nobre. Pense nisso, e liberte-se do jugo da opinião dos outros.

Desconheço a autoria.

Gaiolas e asas

Posted in Atualidade with tags , , , , , , , , , , , , , on 18/03/2010 by Joe

Os pensamentos me chegam de forma inesperada, sob a forma de aforismos. Fico feliz porque sei que Lichtenberg, William Blake e Nietzsche frequentemente eram também atacados por eles. Digo “atacados“ porque eles surgem repentinamente, sem preparo, com a força de um raio. Aforismos são visões: fazem ver, sem explicar.

Pois ontem, de repente, esse aforismo me atacou: “Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas“…

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

Esse simples aforismo nasceu de um sofrimento: sofri conversando com professoras de segundo grau, em escolas de periferia. O que elas contam são relatos de horror e medo. Balbúrdia, gritaria, desrespeito, ofensas, ameaças … E elas, timidamente, pedindo silêncio, tentando fazer as coisas que a burocracia determina que sejam feitas, dar o programa, fazer avaliações …

Ouvindo os seus relatos vi uma jaula cheia de tigres famintos, dentes arreganhados, garras à mostra – e as domadoras com seus chicotes, fazendo ameaças fracas demais para a força dos tigres… Sentir alegria ao sair de casa para ir para a escola? Ter prazer em ensinar? Amar os alunos? O seu sonho é livrar-se de tudo aquilo. Mas não podem. A porta de ferro que fecha os tigres é a mesma porta que as fecha junto com os tigres.

Nos tempos da minha infância eu tinha um prazer cruel: pegar passarinhos. Fazia minhas próprias arapucas, punha fubá dentro e ficava escondido, esperando… O pobre passarinho vinha, atraído pelo fubá. Ia comendo, entrava na arapuca, pisava no poleiro – e era uma vez um passarinho voante. Cuidadosamente, eu enfiava a mão na arapuca, pegava o passarinho e o colocava dentro de uma gaiola. O pássaro se lançava furiosamente contra os arames, batia as asas, crispava as garras, enfiava o bico entre nos vãos, na inútil tentativa de ganhar de novo o espaço, ficava ensanguentado…  sempre me lembro com tristeza da minha crueldade infantil.

Violento, o pássaro que luta contra os arames da gaiola? Ou violenta será a imóvel gaiola que o prende? Violentos, os adolescentes de periferia? Ou serão as escolas que são violentas? As escolas serão gaiolas?

Me falaram sobre a necessidade das escolas dizendo que os adolescentes de periferia precisam ser educados para melhorarem de vida. De acordo. É preciso que os adolescentes tenham uma boa educação. Uma boa educação abre os caminhos de uma vida melhor. Mas, eu pergunto: Nossas escolas estão dando uma boa educação? E o que é uma boa educação?

O que os burocratas pressupõe sem pensar é que os alunos ganham uma boa educação se aprendem os conteúdos dos programas oficiais. E para se testar a qualidade da educação eles criam mecanismos, provas, avaliações, acrescidos dos novos exames elaborados pelo Ministério da Educação.

Mas será mesmo? Será que a aprendizagem dos programas oficiais se identifica com o ideal de uma boa educação? Você sabe o que é “dígrafo“? E os usos da partícula “se“? E o nome das enzimas que entram na digestão? E o sujeito da frase “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heróico o brado retumbante“? Qual a utilidade da palavra “mesóclise“?

Pobres professoras, também engaioladas… São obrigadas a ensinar o que os programas mandam, sabendo que é inútil. Isso é hábito velho das escolas. Bruno Bettelheim relata sua experiência com as escolas:

“Fui forçado (!) a estudar o que os professores haviam decidido que eu deveria aprender – e aprender à sua maneira…“

O sujeito da educação é o corpo porque é nele que está a vida. É o corpo que quer aprender para poder viver. É ele que dá as ordens. A inteligência é um instrumento do corpo cuja função é ajudá-lo a viver. Nietzsche dizia que ela, a inteligência, era “ferramenta“ e “brinquedo“ do corpo. Nisso se resume o programa educacional do corpo: aprender “ferramentas“, aprender “brinquedos“.

“Ferramentas“ são conhecimentos que nos permitem resolver os problemas vitais do dia a dia. “Brinquedos“ são todas aquelas coisas que, não tendo nenhuma utilidade como ferramentas, dão prazer e alegria à alma. No momento em que escrevo este texto estou ouvindo o coral da 9ª sinfonia. Não é ferramenta. Não serve para nada. Mas enche a minha alma de felicidade.

Nessas duas palavras, ferramentas e brinquedos, está o resumo educação.
Ferramentas e brinquedos não são gaiolas. São asas. Ferramentas me permitem voar pelos caminhos do mundo. Brinquedos me permitem voar pelos caminhos da alma. Quem está aprendendo ferramentas e brinquedos está aprendendo liberdade, não fica violento. Fica alegre, vendo as asas crescerem…

Assim todo professor, ao ensinar, teria que perguntar:

“Isso que vou ensinar, é ferramenta? É brinquedo?“ Se não for é melhor deixar de lado”.

As estatísticas oficiais anunciam o aumento das escolas e o aumento dos alunos matriculados. Esses dados não me dizem nada. Não me dizem se são gaiolas ou asas. Mas eu sei que há professores que amam o vôo dos seus alunos. Há esperança…

By Rubem Alves.

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